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3 de janeiro de 2014

Balanço de 2013 - mau para Portugal e UE 




O ano de 2013 não pode ser para esquecer, porque foi mau de mais para a maioria dos portugueses, afligidos pelo desemprego, as reduções de salários, pensões e prestações sociais, pelo desinvestimento do Estado na educação, na saúde, na ciência e inovação, na segurança nacional - enfim, pelo resultado da governação ultraliberal, contra o povo e a favor do capital especulador, que caracteriza  a política mais troikista do que a Troika da dupla PassosCoelho/Paulo Portas. 

Um ano mais de um governo sempre a superar-se a si próprio na arrogância displicente: de Relvas tardiamente afastado, ao acinte da carta de Vitor Gaspar atirando à cara do PM que toda a política económica estava errada, passando pelo despudor de Portas a demitir-se irrevogavelmente  para, na volta, aportar a vice-PM. Um Governo que acaba o ano a ultrapassar-se naincompetência   - com o último chumbo no Tribunal constitucional, o inexequível OE para 2014 ainda não entrou em vigor e já precisa de ser rectificado...

Na mensagem de Natal, o chefe deste Governo quis brindar-nos com um número de malabarismo. Mas os números que contam e de facto arrasam o país são as exportações de pais, mães e filhos forçados a emigrar; é a vertiginosa baixa da natalidade que ameaça não apenas a sustentabilidade da segurança social mas a própria nacionalidade; é o aumento obsceno das desigualdades, num ano em que 25 familias amealharam lucros fabulosos, enquanto milhares de outras empobreceram, sacrificando indelevelmente idosos e crianças e pondo a taxa de suicídios a crescer...

Não há dinheiro, espalham os propagandistas do Governo, para semear o conflito entre gerações e justificar a demolição do Estado social e o assalto aos pobres e classe médias. Mas o Governo não vai atrás dos que fogem ao fisco e se abrigam em offshores, não cobra impostos aos fundos imobiliarios, não toca nas rendas excessivas, não exige execução das contrapartidas dos submarinos, pandures e outros contratos de defesa, deixa impunes os corruptos dos BPN, SLNs/Galileus, das PPS e dos Swaps... Não há dinheiro porque a reforma do Estado não se fez, nem se faz, com um Governo que gere, dolosa e danosamente, os activos do Estado, contra os contribuintes mas para favorecer interesses privados, violando o direito europeu  e a própria segurança nacional, como ilustra o escândalo dos  Estaleiros Navais de Viana do Castelo...

Sobre isso o PR Cavaco Silva não fala. Nem corta fitas: está lá para aparar todas as que PSD e PP entendam encenar. Está lá para dar corda ao relógio do Dr. Portas: o Presidente sabe que a Europa a mando da Sra. Merkel, sejam quais forem os desvios das metas do défice e a espiral na divida pública, vai querer vender-nos um segundo resgate por programa cautelar, para as patroas e os patrões da Troika não terem de admitir que as políticas austericidas matam em Portugal e enterram a democracia na Europa.

Porque o balanço sombrio em Portugal reflecte o balanço alarmante na  Europa em 2013: as crises na vizinhança espelham a irrelevancia ou a impotência europeia. O último Conselho Europeu - onde 27 chefes de Estado e de Governo não foram capazes de demover a teimosia egoísta e míope da Chanceler Merkel, pondo uma União Bancária coxa atrás de um euro que manca - é demonstrativo de como o próprio projecto europeu está em perigo, insuflando forças populistas, racistas e xenófobas que salivam com as eleições europeias. 

Mas, apesar de tudo, eu tenho esperança na Europa e em Portugal - porque sinto também que se mobilizam as forças precisas para combater o mal. 

Porque vejo os recursos e o potencial extraordinário de Portugal e dos portugueses, com uma capacidade de adaptação e de resistência notáveis  - ilustradas, por exemplo, nos jovens cientistas que teimam em investigar e nos prestigiam mundialmente, apesar de todos os cortes e obstáculos.

E porque sei que em Portugal e na Europa há gente com consciência, que não cala nem esquece as lições da história. Por isso se desunham comentadores à direita, a tentar apoucar  a sintonia da esquerda, em que me incluo, com a palavra e a acção do Papa Francisco. Compreende-se-lhes o alarme: sentem-se atingidos com a crítica  acerada que o Papa tem feito à imoralidade do capitalismo desenfreado e da economia financeirizada.

Por não me conformar, por não desistir, deixo aqui os meus votos de um 2014 cheio de força contra a adversidade e pela justiça, para todos os portugueses que também não desistem de Portugal, nem da Europa.


NOTA: escrevi este texto como base da intervenção no "Conselho Superior" na ANTENA 1 no dia 31 de Dezembro de 2013

A Guiné Bissau prova que a PCSD da UE é precisa 

O gravissimo acto de coacção exercido em Bissau sobre a tripulação do avião da TAP que foi forçada a transportar para Lisboa um grupo de 74 pessoas portadoras de  passaportes falsos  prova que o falhanço do funcionamento do Estado na Guiné Bissau não põe apenas em causa a governação, o desenvolvimento  e a segurança  do povo da Guiné Bissau e dos seus vizinhos, mas constitui uma ameaça à Segurança e Defesa de Portugal  e, portanto, da própria Europa.

Fizeram bem as autoridades portuguesas em acolher os adultos e crianças trazidos de Bissau  e em analisar, porventura com a ajuda do ALto Comissariado  das Nações Unidas para os Refugiados, os pedidos de asilo político que à chegada submeteram: se forem de facto sírios a fugir da guerra no seu país, independemente dos meios fraudulentos a que terão recorrido para chegar a país seguro, certamente merecerão o estatuto, o apoio e o acolhimento como refugiados. E não sendo sírios, se forem Somalis, Eritreus, Etiopies ou Sudaneses certamente também se qualificarão para receber refúgio humanitário, visto provirem de países em conflito ou com regimes odiosamente opressores. 

Mas é mesmo essencial proceder-se a uma cuidadosa verificação da identidade e dos antecedentes de quem chegou. Porque misturados com genuínos refugiados podem estar agentes de organizações de malfeitores, inclusive terroristas, com planos de infiltraçao para a prazo desenvolver actividades criminosas a partir do nosso país: sabemos hoje que este não foi um episódio isolado desde que a GUINÉ Bissau  se transformou, lamentavelmente, numa plataforma para o narco-tráfico e outras redes de criminalidade organizada que têm a Europa como alvo  e usam território e cumplicidades  noutros países africanos. Saliento, neste contexto, o significado de se ter demitido o MNE guineense, Delfim Silva, por não querer mais estar associado aos traficantes de droga e de seres humanos com assento no grupo que se intitula governo em Bissau.

A confirmar que este incidente, envolvendo a responsabilidade de quem se intitula ministro do interior guineense, realmente é visto como uma grave ameaça á segurança da Europa, ouvimos a uma declaração de forte alarme e de forte linguagem sobre a Guiné Bissau à Alta Representante e Vice Presidente da Comissão Europeia,  Sra. Catherine Ashton. Mas este não é tempo para a EU exercitar a retórica: é tempo de agir, de passar á acção e de não deixar degradar ainda mais a situação na Guiné Bissau.

Porque a verdade é que esta degradação estava nas cartas e para ela também contribuiu a UE,  certamente sem querer, mas contribuiu... Por decisão da própria senhora Ashton e do Conselho de Ministros para as Relações Externas e a segurança e defesa da UE, a que preside. Decisão que no PE eu e outros deputados criticámos  e procurámos fosse corrigida: estou a referir-me á decisão de retirar a missão de PCSD que a UE tinha enviado para Bissau para apoiar/incitar a reforma do sector de segurança e que devia ter mandado os militares de volta aos quartéis, em vez de os deixar dominar a vida politica e económica da Guiné Bissau. Essa decisão ocorreu em 2009, a pretexto de reagir aos brutais assassinatos de Nino Vieira e seu CEMGFA,  já então entendidos como ajustes de contas entre narco traficantes.  Mas essa era razão para reforçar e intensificar a missão, em vez de a retirar. Retirá-la só equivaleria a UE lavar dali as mãos e abandonar a Guiné Bissau à sua sorte: e assim, uns meses depois, ocorreu o golpe de Estado que depôs o governo e presidentes interinos legítimos e interrompeu o processo eleitoral. A ONU assumiu então o processo, complicado pela dimensão regional e de rivalidade continental  - afinal o golpe foi apoiado pela ECOWAS, dominada pela Nigéria, em despique com Angola (ECOWAS que UE e ONU consideram parceiro credível na África ocidental.!...) E os meios da ONU, apesar no investimento no Representante Especial do SGNU Ramos Horta eram e são escassos e insuficientes para  fazer  o pais reentrar na legalidade e na governação. Em todo este processo, Portugal falou baixinho, sempre muito baixinho e mansamente, manietado pelos complexos coloniais que continuam a dominar  responsáveis políticos pela nossa política externa, á esquerda e a direita...

Pelos intensos  laços humanos e históricos com a Guiné Bissau não admira que Portugal esteja na linha a frente das ameaças colocadas á Europa pelo Estado falhado em Bissau. É tempo, também aqui de Portugal falar audivelmente em Bruxelas e pedir mais do que retórica: acção. Acção pondo em prática a doutrina  da Política Comum de Segurança e Defesa que a UE vem apurando, com mobilização conjunta dos meios, civis e militares, de que os vários Estados Membros dispõem para travar a espiral criminosa que assentou arraiais em Bissau. Agindo obviamente com mandato do CSNU e em articulação com a missão da ONU no terreno e, desejavelmente, em parceria com a União Africana.

Sei demasiado bem que a Guiné Bissau não é o único ponto quente na rota da criminalidade organizada, do terrorismo e outras ameaças aos Estados na Africa Ocidental, e muito menos é desligável da degradação da segurança  na Líbia, no Mali e na Republica Centro Africana e na região do Sahel no seu conjunto. Sei que este incidente em Bissau dá o alarme incontornável que é tempo de agir, e agir coordenadamente na UE e na ONU. E que não é Portugal sozinho! ou qualquer outro EStado Membro sozinho que pode agir: precisamos de accionar a PCSD - Política Comum de Segurança e Defesa da UE e combiná-la com políticas de desenvolvimento e reestruturação democrática que ajudem a restaurar segurança humana na GUiné Bissau e na região.  Os governos europeus não podem continuar a deixar França avancar sozinha , seja no Mali,  seja na Rep. Centro Africana, ou descoordenadamente como na Líbia, para fazer face a ameaças que afectam a segurança europeia no seu conjunto.

Este semana reúne o Conselho Europeu e de Ministros dos Negócios Estrangeiros e de Defesa. E é suposto discutir e tomar decisões nesta matéria. Precisamos que seja revisto o esquema de repartição dos custos de missões de PCSD, para que um país que tem militares, policias ou  juristas capazes de fazer a diferença possa contribuir com o seu trabalho, enquanto outros que não participam com forças ou recursos humanos, contribuam também, pagando pelo menos os encargos financeiros dessas missões. Precisamos de  aproveitar melhor os recursos e identificar os meios para responder as ameaças  e responsabilidades no plano da defesa e segurança marítima : em Portugal, por exemplo falamos muito das oportunidade económicas que vai abrir o Canal do Panamá alargado, mas nada se diz sobre as ameaças, os riscos e responsabilidades acrescidos que dele vão derivar. E a que nunca conseguiremos responder sózinhos! Razão porque precisamos  absolutamente de nos bater pela activação da PCSD - com a vantagem de que no plano marítimo, aéreo ou terrestre, ela colocará Portugal no mapa e valorizará os nossos recursos, geográficos ou humanos, civis e militares, diplomáticos e económicos. Portugal pode e deve ser actor na PCSD e precisa da PCSD - como a Guiné Bissau mete pelos olhos de todos dentro.


NOTA: este é o texto que serviu de base à minha intervenção no "Conselho Superior" na ANTENA1 em 17 de Dezembro de 2013

O estranho caso dos ENVC 

O Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, multiplicou-se nos ultimos dias em entrevistas a orgãos de comunicação social para explicar o estranho no caso da subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Que acabou realmente por não esclarecer na Assembleia da República esta semana...Entrou lá, recordo, a desafiar que viesse uma Comissão de  inquérito da AR, mas mal saiu já PSD e CDS  diligenciavam para ela não acontecer... 

Ora, nas subsequentes entrevistas o Ministro realmente também nada explica, só complica e adensa o estranho caso dos ENVC às mãos da troika governamental Aguiar Branco/Paulo Portas/Passos Coelho.

Em entrevista à ANTENA1/DIÁRIO ECONÓMICO o Ministro afirmou que,  ao assumir a pasta da Defesa,  não encontrou nenhum processo de reestruturação dos ENVC; disse que tentou a privatização dos estaleiros para não enterrar lá mais dinheiro do Estado; e que desistiu dela e passou ao concurso de subconcessão por causa de uma notificação da DG da Concorrência da UE que obrigaria a empresa de Viana do Castelo a devolver 181 milhões ao Estado ou a encerrar. 

Ora o processo de reestruturação da empresa estava em curso, contrapôs entretanto Sócrates, invocando nesse sentido um relatório da Inspecção Geral de Financas de 2009 (embora não tenha explicado incompreensíveis obstáculos, como o que fez encalhar a entrega do navio Atlântida aos Açores). E nesse processo de restruturação se inseriam os contratos para os ENCV fabricarem dois asfalteiros para a Venezuela, contratos que Sócrates incontestavelmente desencantou. Contratos que o Ministro Aguiar Branco agora admite estar a negociar para que passem para a nova empresa subconcessionária!!! 

Ou seja, durante dois anos e meio o Governo nada fez para que os estaleiros tivessem meios para  cumprir essa encomenda, que só por si os tornava viáveis. Mas agora tudo faz para garantir a passagem do contrato para a subconcessionária....

Para não falar das encomendas de navios para a Marinha Portuguesa, que o Ministro Aguiar Branco entretanto cancelou, apesar de fazer todo o sentido econômico que fossem de fabrico nacional  - e o novo CEMA, Almirante Macieira Fragoso, ainda ontem na sua tomada de posse, sublinhou como a renovação dos meios navais "sofreu um grande revés" com as "vicissitudes conhecidas" dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, e advertiu para o "problema sério" que resulta de "uma enorme perturbação no planeamento de manutenção da esquadra ao obrigar a reinvestir em navios com mais de 40 anos de intensa actividade operacional, sem quaisquer garantias que se venha a obter retorno do investimento efectuado".

Claro que nem o Ministo Aaguiar Branco, nem ninguém, ainda explicou porque é que o aço que já estava há muito comprado pelos Estaleiros para fazer navios para a Marinha foi entretanto vendido como sucata pela Administração dos Estaleiros (nomeada por Aguiar Branco) aos estaleiros da Navalria -  por acaso, propriedade da Martifer ....

O Ministro insistiu na referida entrevista que a subconcessão  é a melhor solução para o país. Apesar de, pelas contas do jornal EXPRESSO, se verificar que, com as rendas que a Martifer vai entregar ao Estado e com os 30 milhões que o Governo conta gastar em indemnizações e, ainda, o passivo dos ENCV que o Governo vai ter de assumir, cada português vai pagar entre 2 e 46  euros por o Estado ceder os estaleiros livres de trabalhadores e outros encargos à Martifer -  uma empresa que tem um passivo maior do que os ENVC e não tem especial experiência de gestão de estaleiros  e de construção de navios.

O Ministro insiste também  em apresentar a Comissão Europeia como responsável por impedir a restruturação ou a privatização dos estaleiros, impondo assim como  "única solução" e "cenário menos mau" a subconcessão à Martifer. 
Aqui o Ministro mente, clamorosa e duplamente:
Primeiro acusa o anterior Governo de ter enterrado 181 milhões de euros para os ENVC, mas omite que foi já este Governo quem autorizou a EMPORDEF a dar aval à maior fatia desse valor, cerca de 102 milhões, em 2012. 
E depois mente quando invoca uma decisão tomada pela Comissão Europeia que não existe: o que há é o início de um procedimento de verificação de eventuais ajudas de Estado, que o Governo devia ter cabalmente esclarecido, mas a que respondeu incompetentemente, e pior, de que tira consequências indevidas, mal intencionadas e danosas para o interesse nacional e europeu. 

Mais: a própria Comissão Europeia, na suas comunicações de Janeiro e de Abril de 2013, ensina ao Governo como pode justificar as transferências feitas pelo Estado para os ENCV, transformando-as em ajudas perfeitamente legais, autorizadas para "empresas em dificuldades"  e em processo de restruturação. Transferências tanto mais justificáveis, quanto falamos de um sector estratégico para a recuperação industrial da UE e para a base industrial e tecnológica da Defesa e da Segurança na UE-(recordo que os Estaleiros de Viana do Castelo tanto constroiem navios para uso mercante, como constroiem para a Marinha Portuguesa). 

Ora, o Governo não comunicou  a Bruxelas um plano de restruturação dos ENVC porque não o tem, nunca o teve, efectivamente! O seu plano não é restruturar esta empresa publica, nem sequer privatizar parte, mantendo algum controlo público, como nas OGMA:  despedir os trabalhadores - e o Ministro nesta entrevista finalmente despe a máscara e admite  mesmo que pode haver despedimento colectivo  -  e passar o extraordinário activo estratégico e económico que são os ENVC a uma empresa suspeitamente mais endividada e pouco qualificada para os gerir  é o único plano do Ministro Aguiar Branco. 

Será só colossal incompetência ou estaremos diante de um caso de "captura do Estado" por interesses privados, como aqueles a que ainda ontem aludia o Secretário-Geral do PS? Ora é isso justamente o que investigações do DCIAP, do Tribunal de Contas e das instâncias europeias poderão esclarecer. 

Bem sei que o Ministro se afirma despreocupado ante quaisquer investigações, avançando que o seu ministério tudo entregou ao Tribunal de Contas e à Comissão de Defesa da AR, que tudo foi escrutinado por juris independentes, que tudo foi feito em concurso internacional... 

Mas quem integrou o júri do processo que decidiu a subconcessão, para além de um senhor magistrado do MP que foi no ano passado foi contratado para SG da AR, mas lá não aqueceu o lugar? 
E porque ainda não respondeu o Governo a um conjunto de pertinentes e muito específicas perguntas sobre o processo de privatização gorado e sobre o processo da subconcessão que o Deputado do PS por Viana do Castelo, Jorge Fão, lhe fez no início de Outubro?
E porque será que a Comissão Europeia, na sua comunicação de Abril, mostra ter duvidas sobre um processo de privatização que não era por concurso publico, nem pela máxima oferta? E porque será que o Governo responde que as alegadas ajudas de Estado serão "ajudas à privatização"?
E porque não está ainda on line no site do MDN, da EMPORDEF, ou dos ENVC todos o processamento do concurso de subconcessao, já decidido em Outubro?
E porque entre os anexos do concurso está incluída uma "declaração de confidencialidade" a que se obrigam todos os que levantaram os cadernos de encargos? Declaração de confidencialidade exigida até ao Presidente da Câmara de Viana do Castelo, se quis conhecer os termos a subconcessão? 
E porque que essa declaração e outras relativas ao processo de concurso  foram comunicadas ao Banco Espírito Santo de Investimento, SA? E porque é que o BES, o banco dono da ESCOM responsável pela engenharia financeira crapulosa das contrapartidas dos submarinos - que deviam ter viabilizado e beneficiado os ENCV, mas não viabilizarem nem beneficiaram - é o mesmíssimo banco que, sob o manto do secretismo, assessorou o Governo no processo da subconcessão?
Ah e mais um detalhe a esclarecer -  haverá cláusulas prevendo a contratação de trabalhadores incluídas no contrato de subconcessão ? Se sim, quais? se não, porque não?

Fico a aguardar com o maior interesse as respostas a estas perguntas pelo Ministro Aguiar Branco  ou quem ele designe para o efeito.

E termino citando de novo o CEMA que o Presidente da República impôs ao Governo:  "por muito que se possa querer mudar, a geografia não muda e por isso Portugal será sempre um país marítimo". Sublinhava a importância para a economia da "vontade para apostar no mar e nas actividades com ele relacionadas". Tal Como o Presidente da República tanto tem insistido nas suas intervenções sobre os desígnios de Portugal no Mar.  Por isso fico também a aguardar o que tem o Presidente da República a dizer  sobre o estranho caso dos ENVC às mãos da troika Branco/Portas/Coelho.


NOTA - este foi o texto que me serviu de base a intervenção no "Conselho Superior" da ANTENA 1 em 10 de Dezembro de 2013

2 de janeiro de 2014

ENVC - das contrapartidas falhadas ao falhanço da privatização 

Em 2004, quando assinou o contrato de aquisição de submarinos a um consórcio alemão, o então Ministro da  Defesa Nacional,  Paulo Portas, anunciou que as respectivas contrapartidas, a materializar em 39 projectos que valeriam mil e duzentos milhões de euros, teriam impacto na economia nacional, e em especial na estratégica indústria naval portuguesa, salvando os Estaleiros Navais de Viana do Castelo. 

Os Estaleiros, recordo, iriam beneficiar em encomendas, transferência de tecnologia e equipamentos no valor de 632 milhões de euros - cerca de metade do valor das contrapartidas . Na verdade, os ENVC receberam neste quadro a encomenda de seis porta-contentores - que foram construídos e entregues, mas  representaram não um ganho, antes um prejuízo de 9,3 milhões de euros, segundo uma auditoria da Inspecção Geral de Finanças feita em 2009. E receberam um estaleiro de construção a seco - o estaleiro da Flenders, em segunda mão,- valorizado na lista das contrapartidas em 250 milhões euros,  mas que não vale realmente mais do que um décimo desse valor.

Esse contrato das fictícias contrapartidas dos submarinos está em tribunal por fraude e burla ao Estado, mas isso não impediu o Governo de Passos Coelho de o renegociar com uma das empresas instrumental na fraude, a alemã Ferrostaal, e em 2012 o trocar pela renovação de um hotel de luxo no Algarve e por outro investimento alemão em energias renováveis - um novo contrato que o governo se recusa a tornar público, alegando "segredo de Estado" . É um contrato que viola claramente as directivas europeias aplicáveis a equipamentos de defesa, como são os submarinos.

Nessa renegociação das contrapartidas dos submarinos, salvar os estaleiros navais de Viana do castelo não foi, obviamente, prioridade do Governo. 

Há décadas que sucessivos governos - incluindo do PS - parecem ter apostado em por à frente da empresa pública Estaleiros Navais de Viana do Castelo direcções comerciais incompetentes, incapazes de reestruturar a produção e de lhe assegurar encomendas que viabilizassem a laboração.  Pelo contrário, com a desastrosa gestão do navio Atlântida, que indecentemente se permitiu que o Governo Regional dos Açores pusesse em causa, até aos patrulhões atlânticos que a Marinha regateou e encareceu, tudo se conjugou para asfixiar financeiramente uma empresa que deveria ser estratégica para Portugal  - pela tecnologia, saber e capacidades reunidos numa área industrial especializada, de duplo uso (isto é, que permite construir navios para uso civil e para uso militar), constituindo assim uma base industrial e tecnológica que um país marítimo e com responsabilidades na própria defesa e segurança europeia marítima, como o nosso, não pode dispensar nem perder.

Esta é doutrina europeia assente - como aliás se reflecte num relatório que elaborei recentemente no PE sobre a dimensão marítima da Política Comum de Segurança e Defesa. É doutrina que o Governo de Passos Coelho podia ter invocado para responder às questões  da Comissão Europeia sobre eventuais ajudas de Estado, no valor de 180 milhões de euros, aos Estaleiros de Viana que distorceriam as regras da concorrência. Bastava ao Governo explicar a Bruxelas que os estaleiros de Viana laboravam também para o Estado, construindo navios para a Marinha portuguesa, para justificar os pagamentos estatais aos Estaleiros. Bastava ao Governo de Passos Coelho fazer o que fez a Espanha em relação a estaleiros espanhóis em idênticas circunstâncias.

Mas o Governo de Passos Coelho não fez nada disso! Embora a própria Comissão Europeia o tivesse convidado a apresentar um plano de reestruturação da empresa publica que  são os ENVC, o Ministro da Defesa Nacional, Dr. Aguiar Branco, decidiu, num primeiro momento, privatizar a empresa. O Governo tardou em facultar três milhões de euros de financiamento necessários para a empresa comprar matéria-prima para cumprir  com a encomenda dos asfalteiros venezuelanos. E enquanto isso, matéria-prima já adquirida para os navios a fabricar para a Marinha era vendida como sucata, ao desbarato, a uma empresa concorrente -por acaso detida pela Martifer, a quem o Governo quer entregar  os Estaleiros de Viana.

Com o pretexto da intervenção da Comissão Europeia, o Governo mudou entretanto e subitamente de ideias, em Abril passado: encerrou o processo de privatização e passou a apostar em alugar terrenos e instalações dos ENVC, num contrato de subconcessao que vai custar ainda mais dinheiro aos contribuintes portugueses, vai destruir os estaleiros e despedir os mais de 600 trabalhadores, com dramáticas consequências para todas as famílias de Viana do Castelo.

Acresce que a Martifer, empresa vencedora da subconcessão num concurso pouco transparente em  que acabou por ser única concorrente, apesar de haver pelo menos mais um interessado, não se destaca pela experiência de gestão de construção naval e está em situação financeira muito crítica. 

Tudo cheira e soa muito mal neste desastroso negócio que representa um crime contra trabalhadores nacionais,  contra a indústria nacional, a defesa nacional e o interesse nacional  e europeu. Se houver vergonha, a AR determina instaurar um inquérito. Tudo indica que se imporá também a investigação judicial - nesse sentido, o Ministro pode ter aberto caminho, apresentando queixa contra mim. 

E impõe-se também finalmente que a Comissão Europeia assuma as suas responsabilidades e leve até ao fim a sua própria investigação. Como deputada europeia bater-me-ei nesse sentido.


NOTA: este foi o texto em que me baseei para intervir no "Conselho Superior" na ANTENA 1 no dia 3 de Dezembro de 2013

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